Calor ajuda no desenvolvimento do tambaqui de cativeiro
Você já imaginou o Colossoma macropomum nadando contra a corrente, recebendo alimentação reforçada à base de proteína para ganhar mais peso? Os concluintes de mestrado Nelson Costa e Miguel Canto, do Programa de Pós-Graduação em Biociências da Ufopa, não imaginaram, foram além. Decidiram experimentar em laboratório. Concluíram que, além da ração reforçada, um aumento de mais 6 graus na temperatura contribui para um aumento significativo da massa proteica da espécie. Orientados pelo Prof. Domingos Diniz, testaram a dieta de um dos peixes de maior valor comercial da região Amazônica: o tambaqui. Chegaram a conclusões surpreendentes.
A pesquisa, intitulada “Efeitos da adição do fruto de Myrciaria dubia, camu-camu, e Euterpe oleracea, açaí, em dieta hiperproteica no crescimento do Colossoma macropomum submetido a exercício físico em ambiente aquecido”, surgiu no âmbito do Programa de Ação Interdisciplinar (PAI), desenvolvido na unidade da Ufopa junto a estudantes do Ensino Médio de Oriximiná, Oeste do Pará.
Esses resultados podem mudar radicalmente a maneira de criar o tambaqui, o Colossoma macropomum, em cativeiro. Experimentos de laboratório mostraram que o calor é fator determinante no aumento de peso da espécie. “O calor, por si só já é mais eficiente em produzir o crescimento, independente do exercício que o peixe tenha que fazer para ir em busca do alimento, em períodos de pouca chuva, por exemplo”, explica o orientador da pesquisa Prof. Dr. Domingos Diniz.
A dieta - A dieta do peixe mais consumido na Amazônia muda de acordo com a estação do ano, nos períodos de seca ou na estação chuvosa, que provoca a cheia dos rios. Na seca, se alimenta de algas e pequenos organismos, logo precisa nadar mais para predá-los. Nesse período, o volume dos lagos diminui e os peixes são mais expostos ao sol; a água se aquece, diminuindo o oxigênio disponível para a respiração das espécies. Foram essas variáveis que intrigaram os pesquisadores. “Mesmo com a diminuição do oxigênio, não houve impedimento no crescimento do peixe. Ele tem artifícios de adaptação que usa para crescer num ambiente hostil. Pesquisas anteriores mostraram que os tambaquis possuem, no lábio inferior, células similares a alvéolos, indicando resquícios de um pulmão primitivo no tecido. É essa alternativa que ele usa para respirar em condições adversas”, ressalta Diniz.
Os testes em laboratório simularam as condições de crescimento do peixe em períodos com pouca chuva, com reforço na alimentação da espécie. “Nosso estudo simulou em laboratório as condições da seca (+ 6º C), mas usou uma fruta disponível na cheia, o fruto do camu-camu (Mircyaria dubia), como enriquecimento de dieta, já que é rico em vitamina C. A oferta de proteína também foi aumentada para simular sua dieta na seca”.
Os resultados foram surpreendentes e podem revolucionar a criação em cativeiro do tambaqui. “Com o aquecimento do ambiente (+6° C), o tambaqui dobrou o ganho de peso, em dois meses. Esse crescimento foi ainda maior (2,3x) na dieta com o camu-camu sem proteína adicional, sugerindo que o fruto favoreceu os ganhos metabólicos no sentido do melhor aproveitamento da proteína da dieta. Além de mais essa notável capacidade adaptativa ao calor, cresceu com menor oferta de oxigênio (de 6 pra 4%)”.
No período de cheias, a dieta do tambaqui é à base de frutos, que caem com as chuvas. O peixe nada menos, pois estaciona embaixo da fruteira à espera do alimento, a água não se aquece e a oferta de oxigênio aumenta. “É quando o crescimento estaciona”, conclui o orientador.
A pesquisa – Os pesquisadores vão realizar novas medições em laboratório. Serão analisados a quantidade incorporada de proteína e os hormônios que fazem esse peixe crescer. Em pelo menos dois meses serão divulgados novos resultados. O Prof. Diniz orienta os criadores ou quem pretende investir na criação desse peixe: “Para quem almeja criar esse peixe fica uma dica: ele não prefere sombra e água fresca”.
A conclusão dos pesquisadores é de que os pacotes tecnológicos usados atualmente na piscicultura precisam ser revistos. “O que nós constatamos como resultado foi que fornecer uma quantidade excessiva de proteína para um peixe sedentário é gastar dinheiro desnecessariamente. Nós precisamos sim, de proteínas e vitaminas, mas nós precisamos também dar condições para que esse peixe aproveite a proteína por meio da temperatura elevada, do exercício físico para construir músculo, e não apenas para acumular energia em forma de gordura e não estar apropriado para o consumo”.
Os pesquisadores concluíram também que a espécie gosta do calor e se desenvolve na seca. “Na cheia cresce menos porque os peixes não têm reguladores de temperatura como nós. Nossas enzimas trabalham a 37°, já as enzimas dos peixes, para trabalharem mais, precisam de calor. Quanto mais calor, mais atividades das enzimas que incorporam aminoácidos em forma de proteína no músculo”, completa o orientador Domingos Diniz, na ocasião da realização dos testes em laboratório.
A pesquisa está sendo submetida para publicação em uma tradicional revista inglesa, especializada em assuntos aquáticos, criada em 1948, Hydrobiologia (http://link.springer.com/journal/10750), por meio do Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia: Adaptações da Biota Aquática Amazônica (Adapta), ligado ao Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA).
Lenne Santos - Comunicação/Ufopa
28/3/2016