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Bactérias do Bem: Pesquisa investiga produção de bioativos por actinobactérias da Amazônia

Coordenado pela professora Katrine Escher, do Instituto de Saúde Coletiva (Isco) da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), o projeto de pesquisa "Diversidade de Actinobactérias em solos da Amazônia" investiga, desde 2012, a produção de compostos bioativos, substâncias benéficas de ampla utilização medicinal e industrial, por bactérias. O objetivo é o isolamento e a identificação de micro-organismos autóctones da Amazônia para a obtenção desses compostos. "As plantas têm propriedades medicinais. As bactérias também", afirma Katrine Escher.

Realizado no Laboratório de Microbiologia da Ufopa, o projeto possui vários estudos em andamento, com profissionais de diferentes áreas do conhecimento, na tentativa de traçar um maior espectro de ação das substâncias bioativas isoladas. “É um trabalho interdisciplinar, que integra o Grupo de Pesquisa de Bioativos da Ufopa”. Também participam alunos dos cursos de Farmácia, Biotecnologia e Engenharia Florestal da Ufopa.

Segundo a bióloga, as pesquisas para obtenção de bioativos de origem microbiana iniciaram-se na década de 1930, sendo as actinobactérias - um filo de bactérias Gram-positivas que ocorrem amplamente no solo, onde desempenham relevante papel biológico - um dos grupos mais pesquisados. "São mais de 130 gêneros no grupo das actinobactérias já identificados pela ciência", afirma. Um dos principais gêneros é o Streptomyces, responsável por cerca de 70% dos antibióticos fabricados hoje pela indústria farmacêutica.

A professora da Ufopa explica que as actinobactérias produzem uma infinidade de metabólitos bioativos (substâncias resultantes do metabolismo de uma determinada molécula) com propriedades terapêuticas - antiparasitárias, antitumorais, anti-inflamatórias, antivirais -, além de vitaminas e enzimas de interesse industrial e comercial. “O que me motiva é a busca por novas substâncias para produção de fármacos efetivos contra os micro-organismos multirresistentes”, afirma Escher. "Já sabemos o potencial das actinobactérias para produção de bioativos, mas pouco sabemos da distribuição deste grupo de bactérias na Amazônia, que possui diferentes características de solos e vegetação, possivelmente produtoras de bioativos diferenciados".

Macacaporanga – Uma das pesquisas em andamento isolou actinobactérias dos gêneros Streptomyces sp., Streptomyces cinereus e Microbacterium xylanibyticum presentes no solo circundante à raiz de macacaporanga (Aniba parviflora Syn. A. Fragans), espécie vegetal nativa da Amazônia, estudada nos últimos anos pela capacidade de produzir componentes aromáticos semelhantes aos do pau-rosa (Aniba rosaeodora), espécie ameaçada de extinção utilizada pela indústria de perfumaria, além de suas propriedades medicinais como antibacteriano.

As actinobactérias isoladas revelaram ação antimicrobiana contra fungos e bactérias de interesse clínico e ambiental. De acordo com a pesquisadora, as bactérias do gênero Streptomyces cinereus se mostraram eficientes no combate à levedura Candida albicans e a espécies de Staphylococcus, frequentemente associadas a casos de infecção hospitalar. Elas também se mostraram ativas contra os fitógenos de interesse agronômico, Fusarium sp. e Rhizoctonia solani; e de interesse florestal, como o Postia placenta e o Polyporus sanguineus, que degradam a madeira. “Estamos na fase do isolamento e da purificação da molécula, para a descrição química do composto”.

Os estudos já realizados também apontam para o registro de novas espécies de bactérias para a ciência. “Temos algumas linhagem de Streptomyces que estão em processo de identificação, por meio do DNA, para certificação de que se trata de novas espécies”, afirma.

Enzimas - As actinobactérias encontradas próximas às raízes da macacaporanga também apresentaram potencial para produção de diferentes enzimas de interesse industrial. Uma das mais promissoras é a L-glutaminase, que apresenta ação antitumoral utilizada no tratamento de doenças graves, como a leucemia linfóide aguda (LLA).

Outras enzimas produzidas por essas bactérias são amplamente utilizadas pela indústria alimentícia, como as amilases, que atuam na hidrólise do amido; as pectinases, utilizadas na produção de vinhos e sucos; as proteases, que hidrolisam (quebram) as proteínas; e as lipases, que atuam na degradação de óleos, gorduras e outras moléculas lipídicas complexas, tendo aplicação na fabricação de detergentes de limpeza biodegradáveis e na remediação de solos impactados com óleos.

Entendendo a pesquisa – O estudo da produção de compostos bioativos por actinobactérias contempla várias etapas, que visam ao isolamento e à identificação das bactérias e da estrutura química das moléculas produzidas por esses micro-organismos. Da retirada de amostras de solo ou de outro substrato até a identificação química dos compostos bioativos há um longo caminho a ser percorrido pela ciência.

A primeira etapa da análise visa à caracterização morfológica e bioquímica dos micro-organismos presentes em amostras de solos, sedimentos de rios, partes de plantas, entre outros. “Tudo começa com uma amostra ambiental”, afirma a pesquisadora.

A segunda etapa consiste na prospecção (verificação) dos prováveis metabólitos produzidos pelas actinobactérias. Um dos métodos utilizados é o da fermentação em meio líquido, realizada em biorreatores que induzem as bactérias a produzir substâncias antibióticas ou enzimas. Comprovada a produção, inicia-se o processo de separação para o isolamento dos metabólitos bioativos. “Utilizamos uma série de produtos químicos, como solventes, para resgatar e isolar esses metabólitos”, explica Escher.

Na terceira etapa são realizadas a caracterização química dos metabólitos e a avaliação da sua menor concentração ativa. “Selecionamos uma série de micro-organismos, não só de interesse clínico, mas de interesse ambiental, para testar as atividades antimicrobianas e verificar o espectro de ação do bioativo”.

Rede de Parcerias – A pesquisa conta com a participação de bolsistas de iniciação científica, mestrado e doutorado, além de parcerias com outras universidades públicas: Departamento de Biologia Celular e Molecular da USP/Piracicaba, através da professora Tsai Miu Sui, que colabora na identificação molecular das bactérias; Departamento de Antibióticos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPEDA), por meio das professoras Janete Magali Araújo e Gláucia Lima, para a identificação morfológica e molecular das linhagens de bactérias isoladas; Departamento de Ciências Farmacêuticas e Laboratório de Produtos Naturais da UFPE, por meio da professora Elba Lúcia Amorim, para a elucidação química dos metabólitos.

Outra importante parceria é a do Grupo de Pesquisa de Bioativos da Ufopa, o qual contempla diversos pesquisadores das áreas de Farmacologia e Química de produtos naturais, o que tem possibilitado expandir o perfil metabólico dos bioativos produzidos com a experimentação de outras propriedades biológicas, assim como a elucidação química das substâncias ativas isoladas”, explica a pesquisadora.

Maria Lúcia Morais - Comunicação/Ufopa

16/2/2016

 

Profa. Katrine Escher